sábado, 30 de janeiro de 2010

Manias

Na fila do banco as atenções se voltaram para ele, que deitara no chão. Algumas pessoas diziam que ele desmaiara outras, que ele morreu.
Osvaldino Ferreira era assim, sempre que estava num local cheio de gente tinha a mania de fingir-se de morto, no começo era apenas um divertimento. Quando criança, sempre que se metia em confusão, fingia-se de morto para se safar. E sempre conseguia, muitas vezes, fingia tão bem que dona Mariazinha, sua mãe, o levava para o hospital, em prantos, mas o médico olhava para o menino, e sabendo de sua danação o mandava embora, mas a dona Mariazinha só saía de lá se fosse com um remédio para o filho, e o doutor sempre medicava, muita palmada na mão.
Cresceu com essa mania, que já se tornara uma compulsão, bastava estar num local cheio de gente para logo cair no chão. Era conhecido por todos como “o maníaco das sete vidas”. Talvez fosse hereditário, pois toda a família tinha uma mania. O pai, seu Jerúndio, tinha uma mania que lhe custava muito dinheiro. Sempre que sentava para assistir à televisão, ficava ligando e desligando-a freqüentemente. Era uma televisão a cada semana. Dona Mariazinha, coitada, carrega uma mania desde que começou a andar. A cada três passos D. Mariazinha dava um pulo. Era conhecida na vizinhança como a “mãe canguru”. Osvaldino cresceu vendo as estranhas manias dos pais. Talvez por curiosidade, tentava imitá-los, mas não conseguia, pois não tinha a rapidez do pai e nem a sincronia da mãe. Mas nem sempre, as manias só traziam prejuízo, por exemplo, D. Mariazinha, toda páscoa era paga pela prefeitura para se fantasiar de coelho de páscoa para sair distribuindo ovos nas comunidades carentes. E assim foi toda a vida de Osvaldino. Até o momento em que encontrou uma namorada.
A namorada de Osvaldino, já sabia da mania dele, e até achava engraçado, talvez isso dera inicio ao namoro. Depois de dois anos namorando, Osvaldino pediu a mão de Marcineta em casamento. Marcineta era uma moça, estudada. Estudara quase a vida toda em escola particular, mas parou no ensino médio, por que segundo ela “pra que estudar se o futuro era a morte”. Cresceu num bairro de classe média. Era muito paparicada quando criança por toda a família, ganhava presente toda semana, a casa era lotada por parentes e amigos, até que, no aniversário de quatro anos, ela pôs fogo na cortina, e jogou bolo em todo mundo. Tinha um gene de destruição em massa.
Mas foi assim, D. Mariazinha e seu Jerúndio, estavam muito felizes com o filho, que segundo seu Jerúndio, se tornara homem, pois homem que é homem tem que ter uma mulher. No dia do casamento D. Mariazinha não se segurava de alegria, e saltitava como nunca. Seu Jerúndio, sentado na cadeira de balanço, já fazia planos para quando os netos chegassem. O momento tão esperado chegou, a igreja lotada, as pessoas todas cochichando, falavam de Osvaldino. Querendo entender como uma moça tão estudada casaria com uma pessoa daquela, mas a música começou a tocar e todos ao mesmo tempo, numa sincronia perfeita, olharam para a porta da igreja. Marcineta, com um vestido longo e o véu na cara entrava desfilando entre os bancos da igreja, sorrindo, exibindo-se em passos lentos. Acompanhada por seu pai, que não parava de chorar um segundo sequer. Chegou ao altar. Osvaldino pegou na mão de Marcineta, e sorriu para ela. Ele a amava. E aquele, sem dúvida era o dia mais feliz da vida dele.
A cerimônia prosseguiu até a hora de Osvaldino dizer sim, mas no momento em que iria responder, Osvaldino caiu no chão. Ninguém nem se assustou, pois seria só a velha e conhecida mania de se fingir de morto. Mas os minutos se passavam e Osvaldino não voltou a si. Foi então que perceberam que não era apenas a velha e conhecida mania de Osvaldino de se fingir de morto. Ele agora realmente tinha morrido.
O enterro de Osvaldino foi um dos mais tristes ocorridos na cidade, desde os últimos anos, e o que havia mais gente, quase toda a cidade comparecera ao enterro. OS pais de Osvaldino não paravam de chorar, e a quase viúva Marcineta soluçava o quase casamento. Chorava muito. O enterro seguiu. O dia na cidade não foi o mesmo sem o Osvaldino. E nem seria pelo resto da vida. D. Mariazinha se conformava quando pensava que o filho já nascera treinando para morrer.
Marcineta ficou morando mais os pais de Osvaldino, pois seus pais se mudaram logo depois da morte do quase genro. D. mariazinha cuidava de marcineta como uma filha, e seu Jerúndio, continuava sentado na cadeira de balanço, desligando e ligando a televisão, mas agora lamentando por não poder mais fazer planos para os netos. Meses depois, Marcineta começou a trabalhar no mesmo banco da cidade em que Osvaldino trabalhava. Mas logo foi demitida, porque na hora do expediente, fingira-se de morta.

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